
O sol estava alto e o relógio já marcava quase duas da tarde. De ônibus, fui, do Crato para o Juazeiro, no intuito de vivenciar a já conhecida “Procissão dos Caminhões”, na tarde do dia quatorze de setembro. Explico: tratava-se de uma atividade pastoral proposta aos seminaristas: acompanhar a procissão com os romeiros, nos veículos. Eu, como a maioria dos juazeirenses, cresci participando desse momento, mas, do lado de fora – do lado de cá! Lembro-me que ficava na calçada da Rua do Cruzeiro com Santa Isabel, um pulo de minha casa. Anualmente, aquele era o lugar de esperar os bombons lançados da janela dos ônibus, e, ainda, entre uma desacelerada e outra, respondíamos à gentileza oferecendo um pouco de água gelada. Em minha memória, nenhuma lembrança de fazer tal trajeto no carro de romeiro, do lado de dentro – do lado de lá! E claro, por isso, também, a proposta foi muito bem-vinda.
Chegando a Juazeiro, pouco depois das três da tarde, deparo-me com o previsível: o trânsito parado. Necessário foi descer na parada do Hospital de Fraturas e caminhar pouco mais de um quilômetro até o segundo Batalhão da Polícia Militar. Lá era a concentração, onde marcava o início da procissão e a bênção para os veículos. No caminho, inúmeros ônibus e carros de passeio contornavam o cruzamento das avenidas Padre Cicero com a Castelo Branco.
Na praça do Giradouro, algumas pessoas atônitas, outras já estavam a esperar famigerados doces. No caminho – encurtado pelo estacionamento do Shopping – o aglomerado nas calçadas só aumentava. Parece que todo mundo parou pra ver a procissão. No jardim da Receita Federal, alguns fazendários saíram à porta, pra esperar também. E ainda, ao levantar a vista, acima dos carros, era possível perceber um pé-de-jasmim, que, a todo custo, ultrapassava o muro da escola do 2º grau – já defronte ao Batalhão – que estava a celebrar, também.
O calor é o genuíno de setembro, assim como a alegria. Um, dois, três… dez! Os ônibus passavam num piscar de olhos. Chegando à concentração, juntei-me ao aglomerado para agarinhar algumas guloseimas. Depois, já a postos com o outro irmão seminarista, fiquei um minuto esperando que aparecesse um caminhão pau-de-arara. No entanto, vejo um ônibus bastante enfeitado e, quase no tempo de uma respiração, mudei de ideia. Quando o carro se aproximou e parou, nos identificamos e perguntamos se podíamos entrar. O motorista não hesitou, e de logo autorizou a nossa subida. Os romeiros, mesmo que tímidos, gostaram. Na verdade eles estavam bastante ocupados; Olhavam pela janela, acenando para os filhos da terra, arremessando bombons.
“Quer confeito?” – me ofereceram. Claro que aceitei. Mas recebi um punhado bastante generoso, e só depois entendi a intensão: era pra jogar também! Interessante, porque do lado de lá é diferente. Não dá pra conversar muito – as buzinas cobrem quaisquer ruídos. E, mesmo com toda essa dificuldade, me atrevo e passo a perguntar a um e a outro quantas viagens já fizeram a Juazeiro e se estavam gostando. No entanto, o momento era de lançar os doces.
Já alcançando a rua São Benedito – a segunda rua do trajeto, percebo um senhor bastante emocionado. É o seu Fernando (52 anos) que diz nunca ter imaginado presenciar um momento tão lindo como aquele. Presto mais atenção e percebo que está acompanhando sua esposa, Eliane (49 anos). Ela, sem perguntar, me oferece uma pastilha – desta vez, é para mim! Aceito – e agradeço – também em silêncio. Fico aquietado para não atrapalhar o momento. E então, me vendo tentando registrar por fotos as pessoas que estavam nas ruas, seu Fernando é quem continua a conversa.
Ele começa lamentando não ter comprado mais confeitos, porque queria distribuir a todos que estivessem nas calçadas. É a primeira vez que está em Juazeiro e se emociona muito ao tempo que se indaga: como o povo que aqui tem tanta fé? “Meu filho, a fé das pessoas aqui é de verdade, né só brincadeira, não. Eu nunca vi isso!”, comenta com a voz embargada.
