Francisco “Chico Antonio” Antonio Moreira

Francisco Antônio Moreira, Chico Antônio, nasceu no povoado de Côrte, no município de Pedro Velho, no dia 20 de setembro de 1904. Desde criança mostrou inclinação para a música, para o canto, particularmente para os cocos-de-embolada, gênero musical muito em voga no Nordeste brasileiro de então. Seu pai, homem prático, agricultor honesto e trabalhador, em cuja família não havia precedentes de manifestações artísticas, procurou desde cedo encaminhar o filho para a escola, a fim de assegurar-lhe um futuro melhor. Estudar não era a sua vocação, o seu desejo era “cantar cocos”. Trabalhando na enxada, no sítio do pai, o menino Chico Antônio não perdia a oportunidade de ver as grandes pelejas entre os famosos emboladores de coco que, na época do verão, excursionavam por todo o Estado. Sonhava com o dia em que pudesse, também ele próprio, participar daqueles desafios.

Chico Antônio e Dona Amélia, sua mulher há mais de 50 anos, que já o conheceu coqueiro: “Eu me engracei dela e ela de mim, era hora, digo: Num tem jeito! Fui, comprei uma casa, tinha dois cavalo junto; assim eu casei”. Quando jovem, Chico desafiou muitos coqueiros e tornou-se célebre animando as festas do sertão. A encantadora obra “O coco eu não aprendi a cantá com ninguém, fui aprendendo mais fui puxando na cabeça, do juízo” Aos 89 anos de idade, Chico Antônio estava impossibilitado de trabalhar na enxada, o que fez praticamente a vida inteira, em sua pequena propriedade rural em Pedro Velho (RN). O ganzá, instrumento musical que muitos coqueiros usam, é feito de uma lata ou um cilindro de folha-de-flandres, fechados nas duas extremidades e cheios de chumbo fino. Chico Antônio viveu os últimos dias de sua existência na cidade de Canguaretama, no RN, vindo a falecer no dia 15 de outubro de 1993.

Encontro com Mário de Andrade 

No final do ano de 1928, Mário de Andrade visitou o Rio Grande do Norte e levou o canto e encanto de Chico Antônio para o mundo. “Já estou no RN, pertencendo ao meu amigo Luís da Câmara Cascudo, e o prazer vai enfeitando o presepe. Mario fica encantado ao passar por Natal. Me deito depois desse primeiro dia de Natal. Estou que nem posso dormir de felicidade. Me entro na cama e o vento vem, bate em mim cantando feito coqueiro. Pois aqui chamam de “coqueiro” cantador de cocos. Não se trata de vegetal, não, se trata do homem mais cantador desse mundo: nordestino. O vento de Natal é mano dele … Na noite de Natal, em Natal, Mario assiste a um pastoril de meninas e um Diana caçadora sem nenhuma Grécia. – a população se deslocou do Tirol e da Solidão, bairros vizinhos.

Os bondes, os autos , as “ dondocas” ( ônibus) vêm cheios. Gente de branco, gente de encarnado, der azul, moças bonitas … Junto das barracas do América e do A.B.C, clubes de futebol, a rapaziada faz um sarceiro gostoso, cantando cocos… “ Oh mulé, sai do sereno, / Que essa frieza faz mal … ”. O relato dessa viagem foi publicado em o Turista Aprendiz. Em Janeiro Mário conhece Chico Antônio, que para ele vale uma dúzia de Carusos. “ ai seu dotô / quando chegar em sua terra/ vá dizer que Chico Antonio/ É danado pra embolá!” Oh-li-li-ô! Boi Tungão / Boi do Maiorá …´´. Estou divinizado por uma das comoções mais formidáveis da minha vida. Chico Antônio. Cantava a noite inteira por uma cachaça, por coisa nenhuma e passa a noite inteira cantando sem parada. “Que artista. A voz dele é quente e de uma simpatia incomparável… “ Homem bonito e forte já estragado com seus 27 anos e muita cachaça.

A admiração de Antonio Bento 

“(…) Vida poética, gosta tanto das mulheres, como elas dele, bom na cachaça. Bom companheiro para brincadeiras e afetuoso, segundo dizem seus companheiros. Gasta à-toa todo dinheiro que ganha. O coco que Chico Antônio gosta mais de cantar e acha mais bonito é “Iaiá pega o Boi”. O que faz maior impressão é o “Boi Tungão”, descrição do inferno. Por causa desse coco, é que dizem que ele tem um “trato com o diabo” Tanto gosta de cantar o coco solto (toada quadrada, parcela, cocos de solos pequenos) como o coco de amarração (embolada). Prefere improvisar, sem saber o que está dizendo. Me disse mesmo que prefere cantar esquecendo, tirando as emboladas rapidamente, no momento”.

(Re) descoberta
Desde janeiro de 1929 Chico Antônio e Antônio Bento não mais se viram pessoalmente: era 1982 e a notícia da ‘redescoberta’ de Chico Antônio foi um dos assuntos da conversa informal em torno de uma mesa de bar na Avenida Atlântica, onde estavam presentes Aloísio Magalhães (1927-1982), Carlos Augusto Calil e Eduardo Escorel. Dez anos antes, Aloísio Magalhães ocupara diversos cargos na área cultural do governo federal, procurando introduzir uma política de valorização das referências culturais brasileiras partindo da necessidade de preservação da memória e dos bens culturais, conseguindo converter suas idéias em diretrizes políticas para obter recursos que viabilizariam projetos de resgate e preservação da memória nacional. A contribuição dada por Aloísio Magalhães colocou no cenário cultural brasileiro categorias opostas que convivem pluralidade da cultura brasileira como ‘nacional’ e ‘estrangeiro’; ‘nação’ e ‘região’; ‘passado’ e ‘futuro’; ‘tradição’ e ‘modernidade’; ‘popular’ e ‘erudito’; ‘história’ e ‘memória’; ‘unidade’ e ‘diversidade’.

 Pois em 1982 Aloísio Magalhães estava envolvido na Secretaria de Cultura do Ministério da Educação e Cultura e no mês de maio estivera com Deífilo Gurgel e Chico Antônio em Natal. Em consonância com as idéias do cineasta Eduardo Escorel, Aloísio Magalhães acreditava que seria necessário registrar em imagens ‘o grande cantador’, “já alquebrado nos seus oitenta anos de idade. Essa conversa sem compromisso mudaria de figura, criando uma obrigação, quando recebemos dias depois a notícia que Aloísio partira numa viagem sem retorno ”. Em setembro, o cineasta chegaria à localidade de Porteiras acompanhando a equipe de pesquisadores encarregados pelo Projeto “Estrada Nova: Chico Antônio e Seu Meio”. O projeto utilizava métodos pioneiros como o uso de recursos audiovisuais e visava “contribuir para reforçar a identidade cultural do Município” fazendo avançar a política preconizada pelo Ministério da Educação, em busca da ampliação da ‘responsabilidade social’.

Com o pouco tempo disponível para realizar seu próprio documentário, Eduardo Escorel conseguiria montar a homenagem ao coquista através de “Chico Antônio, herói com caráter.” A voz do cantador seria também ´preservada´ na entrevista gravada para a série “Memória Viva”, produzida pelo jornalista Carlos Lyra, na época veiculada pela TV Universitária. Na mesma ocasião em que foi produzido o seu primeiro LP “Na Pancada do Ganzá”, onde canta com seu companheiro de emboladas, o respondedor Paulírio Sebastião da Silva. Foram depois convidados para uma apresentação em São Paulo, para o programa Som Brasil, da TV Globo, na manhã dominical de março de 1982.

 O coquista Chico Antônio deixou de cantar tão logo voltou da viagem para São Paulo, cessando a cantoria no início da década de 1980. Nove anos depois, em janeiro de 1989, o cantador estava morando na casa de um de seus sete filhos, Pedro Francisco Moreira, quando recebeu a visita do jornalista Amarildo Carnicel – que na época refazia o trajeto de Mário e Andrade em sua viagem etnográfica pelo nordeste do Brasil. As fotos feitas por Amarildo Carnicel revelam um Chico Antônio doente e silenciado, que morreria coincidentemente no mês de outubro de 1993 em plena semana de comemorações do centenário de nascimento do musicólogo paulistano Mário de Andrade, promovida pelas universidades federais dos Estados do Rio Grande do Norte e da Paraíba. Somente em fins da década de 90 surgiriam questões mais profundas em torno de ‘direitos autorais’ e de direitos de divulgação do nome, canto e imagem do coquista Chico Antônio publicamente.

Suas obras:“Boi Tungão”, “Coco de Usina”, “Adeus Luquinha”, “Balão, mané mirá”, “A pisada é essa (esse é bom pueta)”, “Amador Maria”, “Eu vou, você num vai”, “Jurupanã”, “Dois tatú”, “Eh tum”, “Ôh mana, deixa eu ir”, “Pr’onde vais, mulé?”, “Iaiá, dá no boi”, “Êh boi!”, “Engenho novo”, “Justino Grande” e outros. Chegou a fazer um CD, que segue no link: https://www.youtube.com/watch?v=CWboJcSSr_A. A sua obra mais famosa foi “Boi Tungão”, que chegou a ser a trilha sonora do filme “O homem que desafiou o diabo” com Marcos Palmeira que foi gravado no Rio Grande do Norte.

Legado
Marta Viana Moreira de Meireles, neta de Chico Antônio, guarda uma bengala e um ganzá do avô, ela guarda parte da herança de Chico Antônio e luta pelos direitos autorais do avô, e até criou um Instituto de Cultura que levou o nome de Chico Antonio, na cidade de Pedro Velho, mas hoje se encontra desativado.

Fontes: NEWS. Cled, CHICO ANTÔNIO, O mestre do ganzá, Disponível em: http://www.clednews.com/2010/09/chico-antonio-o-mestre-do-ganza.html. Acessado em: 12 de dez. de 2015.
PLURAL. Substantivo, MÁRIO DE ANDRADE E SUA PAIXÃO POR CHICO ANTÔNIO, Disponível em: http://substantivoplural.com.br/mario-de-andrade-sua-paixao-por-chico-antonio/. Acessado em: 12 de dez. de 2015.
EQUINOYA. O canto sedutor do coquista Chico Antônio: Memória, Política e Turismo Cultural. Disponível em: http://www.equiponaya.com.ar/turismo_cultural/congreso2003/ponencias/Gilmara_Benevides.htm. Acessado em: 12 de dez. de 2015.

 

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