Égua russa no Trapiá dos Severos

Era menino, e já via malvadezas de gente grande, piores do que explica o samba: “(…) a maldade dessa gente é uma arte (…)”. Presenciei adolescentes incandescendo prego e jogando-o, no escuro da boca da noite, para o sapo engolir. Igual a marinheiros que, retirando jerimuns da água fervente, na cozinha do navio, jogam-nos aos tubarões, no mar, que, ao engoli-los, de repente, bóiam mortos. Tubarão engole até asa de avião, mas morre se ela estiver incandescente, saída do fogo. A maldade é a mesma, apenas em coisas diferentes. Matavam o cururu, mas corriam com medo do inspetor de menores, “seu Ananias”, que assombrava Itabaiana só com o seu grande e largo bigode: “Menino malvado, judiando com o sapo”!

Foi então que decorei o verbo ‘judiar’; para, já na adolescência, perceber que judiar é fazer como judeu flagelando o Messias. Sem dúvida, tal generalização é um preconceito consequente da “Via Sacra”, nas paredes da Igreja, mostrando uns judaicos, torturando Jesus Cristo. O preconceito é histórico; e também a maldade, tanto é assim que persiste, nos dias de hoje; ainda há candidato à presidência favorável adepto da tortura… Mudado o que deve ser mudado, também observo pessoas instruídas pelo marcatismo (McCarthyism), associando a palavra ‘russo’ ao significado daquilo que não presta; pessoas ideologicamente inocentes, em circunstâncias constrangedoras, lamentando: “A situação está russa”…

Só não sabia explicar o porquê da besta, nascida e crescida nos pastos sertanejos, ser chamada de “égua russa”. Vi o povo festejando na ponte, comunguei a alegria do vídeo de Tião Cordeiro Braga, até com descrição emocionante: chuvas à seca de Nazarezinho. Mas fiquei curioso, quando as torrenciais águas, em volumosa correnteza, com espumas, barulho e tudo, iam para tombar na Cachoeira do Sítio Pitombeira, corriam pelo Riacho do Trapiá dos Severos (Lembrança da Dinastia dos Severos, fundada pelo general Septímio Severo, entre 193 d.C a 235 d.C, no Império Romano) “ao colo do Açude de São Gonçalo”, inundando, transbordando o “Riacho da Égua Russa”. Somente ontem, o cajazeirense Professor Francelino Soares esclareceu: “A égua é ruça”…

Por Damião Ramos Cavalcanti

Fonte: www.drc.recantodasletras.com.br

 

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