Vou-me embora pro passado

“No rastro da Bandeira de Manuel”

Vou-me embora pro passado / Lá sou amigo do rei / Lá tem coisas “daqui, ó!” / Roy Rogers, Buc Jones / Rock Lane, Dóris Day / Vou-me embora pro passado / Porque lá, é outro astral / Lá tem carros Vemaguet / Jeep Willes, Maverick / Tem Gordine, tem Buick / Tem Candango e tem Rural.

Lá dançarei Twist / Hully-Gully, Iê-iê-iê / Lá é uma brasa mora / Só você vendo pra crê / Assistirei Rim Tim Tim / Ou mesmo Jinne é um Gênio / Vestirei calças de Nycron / Faroeste ou Durabem / Tecidos sanforizados / Tergal, Percal e Banlon / Verei lances de anágua / Combinação, califon /  Escutarei Al Di Lá / Dominiqui Niqui Niqui / Me fartarei de Grapette / Na farra dos piqueniques.

Vou-me embora pro passado. / No passado tem Jerônimo / Aquele Herói do Sertão / Tem Coronel Ludugero / Com Otrope em discussão / Tem passeio de Lambreta / De Vespa, de Berlineta / Marinete e Lotação./ Quando toca Pata Pata / Cantam a versão musical / “Tá Com a Pulga na Cueca” / E dançam a música sapeca / Ô Papa Hum Mau Mau / Tem a turma prafrentex / Cantando Banho de Lua / Tem bundeira e piniqueira  / Dando sopa pela rua.

Vou-me embora pro passado / Que o passado é bom demais! / Lá tem meninas “quebrando” / Ao cruzar com um rapaz / Elas cheiram a Pó de Arroz / Da Cachemere Bouquet / Coty ou Royal Briar / Colocam Rouge e Laquê / English Lavanda Atkinsons / Ou Helena Rubinstein / Saem de saia plissada / Ou de vestido Tubinho / Com jeitinho encabulado / Flertando bem de fininho / E lá no cinema Rex / Se vê broto a namorar / De mão dada com o guri / Com vestido de organdi / Com gola de tafetá.

Os homens lá do passado / Só andam tudo tinindo / De linho Diagonal / Camisas Lunfor, a tal / Sapato Clark de cromo / Ou Passo-Doble esportivo / Ou Fox do bico fino / De camisas Volta ao Mundo / Caneta Shafers no bolso / Ou Parker 51 / Só cheirando a Áqua Velva / A sabonete Gessy / Ou Lifeboy, Eucalol / E junto com o espelhinho / Pente Pantera ou Flamengo / E uma trunfinha no quengo / Cintilante como o sol.

Vou-me embora pro passado  / Lá tem tudo que há de bom! / Os mais velhos inda usam / Sapatos branco e marrom  / E chapéu de aba larga / Ramenzone ou Cury Luxo / Ouvindo Besame Mucho / Solfejando a meio tom.

No passado é outra história / Outra civilização… / Tem Alvarenga e Ranchinho  / Tem Jararaca e Ratinho / Aprontando a gozação / Tem assustado à Vermuth / Ao som de Valdir Calmon / Tem Long-Play da Mocambo / Mas Rosemblit é o bom / Tem Albertinho Limonta / Tem também Mamãe Dolores / Marcelino, Pão e Vinho / Tem Bat Masterson, tem Léssie / Túnel do Tempo, tem Zorro / Não se vê tantos horrores.

Lá no passado tem corso  / Lança perfume Rodouro / Geladeira Kelvinator / Tem rádio com olho mágico / ABC a voz de ouro / Se ouve Carlos Galhardo / Em Audições Musicais / Piano ao cair da tarde / Cancioneiro de Sucesso / Tem também Repórter Esso / Com notícias atuais / .Tem petisqueiro e bufê / Junto à mesa de jantar / Tem bisqüit e bibelô / Tem louça de toda cor / Bule de ágata, alguidar / Se brinca de cabra cega / De drama, de garrafão / Camoniboi, balinheira / De rolimã na ladeira / De rasteira e de pinhão.

Lá, também tem radiola / De madeira e baquelita / Lá se faz caligrafia / Pra modelar a escrita / Se estuda a tabuada / De Teobaldo Miranda / Ou na Cartilha do Povo / Lendo Vovô Viu o Ovo  / E a palmatória é quem manda. / Tem na revista O Cruzeiro / A beleza feminina / Tem misse botando banca / Com seu maiô de elanca / O famoso Catalina. / Tem cigarros Yolanda / Continental e Astória. / Tem o Conga Sete Vidas, / Tem brilhantina Glostora / Escovas Tek, Frisante / Relógio Eterna Matic / Com 24 rubis / Pontual a toda hora.

Se ouve página sonora / Na voz de Ângela Maria / “- Será que sou feia? / – Não é não senhor! / – Então eu sou linda? / – Você é um amor!…” / Quando não querem a paquera / Mulheres falam: “Passando, / Que é pra não enganchar!” / “Achou ruim dê um jeitim!” / “Pise na flor e amasse!” / E AI e POFE! e quizila / Mas o homem não cochila / Passa o pano com o olhar / Se ela toma Postafen / Que é pra bunda aumentar / Ele empina o polegar / Faz sinal de “tudo X” / E sai dizendo “Ô Maré! / Todo boy, mancando o pé / Insistindo em conquistar.

No passado tem remédio / Pra quando se precisar / Lá tem Doutor de família / Que tem prazer de curar / Lá tem Água Rubinat / Mel Poejo e Asmapan / Bromil e Capivarol / Arnica, Phimatosan / Regulador Xavier / Tem Saúde da Mulher / Tem Aguardente Alemã / Tem também Capiloton / Pentid e Terebentina / Xarope de Limão Brabo / Pílulas de Vida do Dr. Ross / Tem também aqui pra nós / Uma tal Robusterina  / A saúde feminina.

Vou-me embora pro passado / Pra não viver sufocado / Pra não morrer poluído / Pra não morar enjaulado. / Lá não se vê violência / Nem droga nem tanto mal. / Não se vê tanto barulho / Nem asfalto nem entulho. / No passado é outro astral / Se eu tiver qualquer saudade / Escreverei pro presente / E quando eu estiver cansado / Da jornada, do batente / Terei uma cama Patente / Daquelas do selo azul / Num quarto calmo e seguro / Onde ali descansarei / Lá sou amigo do rei / Lá, tem muito mais futuro / Vou-me embora pro passado.

(Nota do Autor. Poema inspirado na leitura do livro Memorial de Marco Polo Guimarães, Edições Bagaço; em conversa antiga; e em outros poemas meus)

Fonte: www.efecade.com.br

RÁDIO CORREIO AM 1200 - MACEIÓ